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Maria, mulher de verdade

  • reportagem especial
  • 28 de nov. de 2016
  • 4 min de leitura

Maria, mulher, mãe, avó, bisavó, guerreira e também artista..

O COMEÇO

Aos 81 anos, dona Maria Soares de Jesus ainda se recorda das dificuldades vividas por ela desde sua infância. Nasceu na cidade de Gravatá em Pernambuco, mas ainda criança mudou-se com a sua família para as regiões de caatinga, onde era a rota do famoso rei do cangaço, Virgulino Ferreira da Silva (lampião).

Maria lembra que sua mãe lhe contava sobre as histórias de lampião, entre elas, que ele pernoitou em sua casa, onde ela cozinhou para ele e todos os cangaceiros de sua comitiva. Ainda jovem Maria veio para Londrina, no qual conheceu um rapaz do Rio Grande Do Sul, teve um relacionamento conjugal durante 14 anos, desta relação nasceram quatro filhos, Olga, Onice,Ondina e Telmo, que já é falecido. “Sou solteira, não fui casada no papel”, afirma Maria.

Devido à violência moral sofrida por parte do marido, ela o mandou embora de casa. Maria era agredida com palavras e seu marido quebrava determinados objetos na sua frente, com a intenção de lhe amedrontar. Mesmo separados, o fato dele pagar pensão para as crianças, o fazia se sentir no direito de ter domínio sobre ela, tentando proibi-la de trabalhar. Mas a pensão não era suficiente para o sustento da família, então ela não acatou as ordens do ex marido e foi trabalhar como empregada doméstica.

Foram dias difíceis para uma mãe cuidar sozinha de quatro filhos. O ex-marido cumpriu com apenas dois meses de pensão, e depois interrompeu os pagamentos. Um advogado foi à procura dele e depois de encontrado o ex-marido quitou três meses de pensão atrasada. Entretanto, depois da quitação ele sumiu, e até hoje, dona Maria não tem mais notícias de seu paradeiro.

MÃE SOLO

Em meio ao impasse de ter que trabalhar e ao mesmo tempo cuidar dos quatro filhos, Dona Maria, teve que buscar alternativas para conciliar as duas funções. Em alguns momentos, coube à filha mais velha à responsabilidade de cuidar dos irmãos menores. Maria pagava aluguel, trabalhava de domingo a domingo, e mesmo assim, esteve presente na formação dos filhos, que hoje só lhe dão orgulho.

A dona Maria mãe solo e doméstica, passou por grandes dificuldades durante toda à vida. Ela chegou a morar durante um ano em um porão, que segundo ela, era quase “inabitável”, mas era o que tinha ao seu alcance na época. Com a ajuda dos ex-patrões, ela conseguiu encontrar um outro imóvel, e se mudou para ele, com os quatro filhos. Sempre trabalhando, também mostrou e levou aos filhos essa virtude. “Tanto eu como os meus filhos, sempre trabalhamos, à vida toda, não tinha moleza” confessou. Hoje Dona Maria já tem quatro bisnetos e cinco netos, mas ela reconhece que as vezes perde as contas “é muita gente” afirma. Atualmente ela mora com uma filha, e um neto.

A PERDA IRREPARÁVEL

Há três anos dona Maria passou por mais um momento difícil em sua diária batalha de vida. O filho batizado como Telmo Soares de Jesus, morreu devido a um câncer. Ele era o único homem, entre as demais filhas, todas mulheres. Dona Maria lembra com tristeza deste período, e não conseguiu contar muitos detalhes do que ocorreu, mas como em todas ocasiões difíceis que ela já viveu, tenta superar mais essa dor, e buscar forças para continuar apesar de tudo. Para ela todos os filhos foram, e ainda são as pessoas mais importantes de sua vida, e perder um filho, é como perder uma parte de si.

À FRENTE AO SEU TEMPO

No período em que Maria se separou, esse ato não era comum. Muitas mulheres que tomavam iniciativas como as de Dona Maria, de serem independentes e de não se submeterem ao maus tratos dos maridos, não eram “bem aceitas” pela sociedade. Além de sofrerem com o ato de separação, que é algo delicado e difícil, tanto para a mulher, quanto para os filhos, as “mães solteiras” eram alvo fácil de críticas e opiniões opressoras. Dona Maria garante em alto e bom som que tomou a decisão certa, “não me arrependo de nada que fiz, criei todos os meus filhos e nenhum deles virou bandido (...) graças a Deus todos são trabalhadores” conta.

O PRESENTE

No presente, Dona Maria é aposentada, posição que ela já ocupa há mais de dez anos. “Hoje em dia eu estou no paraíso” é assim que ela se refere à vida que leva. Olhando para trás e lembrando de tudo o que já sofreu, os dias atuais são leves e felizes para a Dona Maria. Em meio aos afazeres domésticos de avó, mãe, aposentada e dona de casa, ela dispõe de um tempo para frequentar o Centro de Convivência do Idoso, na região onde mora em Londrina. Lá no Centro ela faz várias atividades, de quarta à sexta, e encontrou nas artes, um novo modo de permanecer viva e levar os dias.

A SENSIBILIDADE DE ARTISTA

Maria em seu grupo de teatro

Dona Maria, ao frequentar o Centro de Convivência do Idoso, entre várias atividades de artes, descobriu o teatro. João Henrique Bernardi(in memorian) na época num projeto teatral com a terceira idade, conheceu dona Maria e se encantou com sua história de vida. Ela contou que quando criança, morava nas caatingas, trilha do cangaceiro mais temidos do nordeste, Lampião, e que sua mão chegou a cozinhar para ele. A história rendeu uma montagem para o teatro: Uma História de Amor de Lampião e Maria Bonita. Esta senhora carrega uma carga de emoção que aflora quando está no palco. O trabalho desenvolvido por este diretor visava resgatar a memória emotiva das atrizes da terceira idade, porque elas têm muita bagagem de vida pra contar. Depois deste trabalho, ela participou de outro espetáculo, Rosas de Outubro, também no Centro de Convivência. Hoje ela está apenas fazendo seus artesanatos, se dedicando a filha e o neto que moram na mesma casa, no qual ela se enche de alegria ao falar. Rememora suas lembranças com quem gosta de ouvi-la, pois, história pra contar ela tem e são muitas.

Reportagem: Nayara Caroline, Therezinha Gaivota, Patricia Braz, Monica Peres.

Fotos e edição: Polliana Casoti

 
 
 

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